25/01/2019

Travessia dos Parques: Pico do Itambé x Rio Preto

Esse é mais um daqueles roteiros que namorei por tempos antes de conseguir cumprir. Tive notícia dessa rota pelos Parques do Pico do Itambé e do Rio Preto lá pelos idos de 2014, quando da publicação de um livrinho sobre os parques estaduais de Minas Gerais. Bastaram algumas fotos do Rio Preto para que eu embarcasse pra lá ainda naquele ano. A visita foi só um tira-gosto, o que eu queria mesmo era cruzar toda aquela banda do Espinhaço a pé!

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Nesse meio tempo concluí a graduação, me mudei pra Bahia, retornei pra Minas, iniciei outra graduação… até que em novembro de 2018, concretizou-se a chance de percorrer tão sonhada travessia. Embarcamos, Paulo e eu, para uma jornada de 4 dias, atravessando serras e rios, campos e cerrados, entre Santo Antônio do Itambé e São Gonçalo do Rio Preto.

1º dia: Santo Antônio do Itambé x Pico do Itambé

Na quarta-feira, véspera de feriado, embarquei no ônibus da viação Serro com destino a Santo Antônio do Itambé. Paulo deixou pra comprar a passagem na última hora (e minuto! rs) e não conseguiu embarcar no ônibus das 22:00. Como eu já tinha o bilhete, fui na véspera, enquanto ele embarcou na manhã seguinte, no carro das 06:00.

A viagem foi tranquila e bem demorada. São aproximadamente 250km entre BH e Santo Antônio, mas a viagem teve quase 7 horas de duração. Bom, não tinha pressa, já que não era muita vantagem começar essa trilha de madrugada. Às 4:45 do feriado de Proclamação da República desembarquei na pequena Itambé, cidadezinha aos pés do Teto do Sertão, como é conhecido por aqui o Pico do Itambé.

Fiz uma horinha em uns banquinhos que tinham lá por perto, arrumando minha cargueira calmamente. Como já era horário de verão, o dia ainda ia demorar um pouquinho pra clarear. Mesmo assim resolvi me adiantar e seguir pra portaria do Parque Estadual do Pico do Itambé – PESPI, onde poderia ficar mais confortável que ali no meio da rua. Às 5:18 deixei o local de desembarque e fui atravessando cidade. Depois de uma forte descida, cruzei uma ponte e começou um longo trecho no qual os aclives predominavam. Ainda dentro da cidade existem umas subidas bem acentuadas, de subir ralando o peito rs.

Depois de muito subir o calçamento fica para trás e pego uma estradinha de terra bem úmida. Passo pela Ponte de Pedra, local onde o Córrego Mãe d’Água forma alguns poços e corredeiras. Depois de passar pela ponte, deixo a estradinha de terra para tomar uma trilha-atalho que evita uma bela barriga. Já com dia clareando, às 6:18 chego à portaria do PESPI, onde um guarda-parque já me aguardava. Como ainda estava bem cedo, faço uma parada prolongada no local, aproveito para tomar café e bater um bom papo com o guarda, cujo nome me foge.

Objetivo do dia

Após os trâmites de entrada, às 7:39, enfim, deixo a portaria e começo a travessia de vez. O início da jornada pelo parque é por uma estradinha precária, acessível somente por veículos 4x4 e motos. Ela segue em constante aclive, ganhando alguma altitude neste trecho inicial. Logo depois da portaria passo pelo acesso da Cachoeira Água Santa, mas pelo horário não compensava uma visita. Adiante passo por um afluente do Córrego Água Santa, que estava com um bom volume d’água.

Mesmo cedo, o sol já esquentava bastante e eu agradecia pelas árvores na lateral da estradinha, que propiciavam um pouco de sombra. Faço somente curtíssimas paradas para fotos, pois é um trecho meio entediante, ainda mais que não tem muito visual da região. Às 8:40 passo pelo acesso da Cachoeira do Neném, outra que deixei pra uma próxima, tendo em vista que meu objetivo pela manhã era a cachoeira do Rio Vermelho.

Um tempinho depois, às 9:00, chego à bifurcação e acesso pra cachoeira do Rio Vermelho, depois de percorrer 7.6k desde o centro de Santo Antônio do Itambé. Neste ponto sigo pela direita, mantendo o rumo norte. Deixo a estradinha e passo a caminhar por uma trilha ampla, bem cuidada pelo PESPI. Logo no começo da trilha resolvo deixar a cargueira no meio das árvores e seguir somente com uma mochilinha de ataque, levando água e um lanche, pois eram 6k entre ida e volta.

A trilha não apresenta nenhuma dificuldade no quesito navegação, é bem sinalizada e demarcada, contando com corrimãos, pontes e alguns bancos para facilitar a caminhada. Ainda sim existem alguns trechos bem irregulares, sobre pedras dispostas de forma a facilitar a passagem nas áreas úmidas.

Prossigo por uma trilha bem ampla que avança pelas encostas da Serra do Itambé, na região predominam os capões de mata, com muitos exemplares de candeia. Gastei aproximadamente 1h até a cachoeira, depois de cruzar a ponte de concreto sobre o Rio Vermelho, a descida é feita por uma trilha com a manutenção em dia, que conta com um extenso corrimão para facilitar. Após a chegada ao leito basta subir algumas dezenas de metros pelas margens e lajeados para alcançar a cachoeira. Devido à chuva dos dias anteriores a queda apresentava um bom volume d’água. Mesmo com o sol tímido entre as nuvens, não resisti a um banho de rio. O lugar é bem agradável e merece essa esticadinha.

Cachoeira do Rio Vermelho

Às 11:06, sob uma leve garoa, deixo a cachoeira para retomar o trajeto até o Pico do Itambé. Até a bifurcação eram mais 3k, por um relevo mais ou menos suave. Às 11:54 reencontro a trilha para o pico e aproveito o horário para fazer um lanche e descansar um pouco mais antes da subida. Assim que volto a andar a garoa, que tinha sumido, torna a cair. Sigo subindo pela estradinha até a entrada de uma outra trilha-atalho, que corta outra barriguinha. A chuva agora aperta. Por sorte estava nas proximidades do casebre do Seu Joaquim Moacir, então corri pra lá pra me abrigar sob um telhadinho de palha anexo à casa.

Fico quase 20 minutos por lá, ao lado de uma casa bem prejudicada e, aparentemente, em obras ou coisa parecida com isso. A chuva enfraquece e retomo a caminhada. A estradinha fica pra trás, o trajeto agora é por uma trilha bem consolidada serra cima. Logo que saio do casebre cruzo um pequeno sumidouro, onde a água que escorre pela serra some entre as rochas e passa por baixo da trilha. A subida vai ficando cada vez mais acentuada e a vegetação vai mudando. Os capões de mata agora dão lugar aos campos rupestres e de altitude. A trilha é bem aberta, mas o mau tempo não me permite enxergar muita coisa além de algumas poucas áreas no sopé da serra.

Depois de uma boa subida, às 14:04 chego à Lapa do Morcego, um possível abrigo caso seja necessário. Até aqui tinham sido 16.9k e a altitude beirava os 1.560m. A caminhada segue por um aclive mais suave, avançando pelos campos rupestres, com vários afloramentos rochosos se destacando. O tempo vai dando sinais de melhora, mas a chuva que caiu mais cedo vai descendo pela trilha, como se fosse uma nascente.

Às 14:13, 375 metros após a Lapa do Morcego, chego ao último ponto de água do primeiro dia de travessia. O local está sinalizado para o montanhista não esquecer de se abastecer no local. Coleto a água de uma das nascentes do Córrego da Serra, afluente do Rio Vermelho, e sigo a subida. Entre umas nuvens e outras, o Pico do Itambé vai dando as caras no horizonte.

Após um bom tempo caminhando por um aclive mais suave, às 15:14 passo pela ponte pênsil do Rebentão e começo um trecho de subida bem puxada. Antes de cruzar a ponte, porém, vou observar uma das gigantescas fendas que se formaram no local, resultado de milhões de anos de intemperismo químico, que provavelmente se aproveitou das falhas e fraturas já existentes nas rochas.

Depois de apreciar as formações geológicas, dou início ao trecho mais puxado da subida. Vou ascendendo lentamente, aproveitando as paradas para dar uma conferida no celular e ver a situação do Paulo, que a essa altura já havia começado a caminhada. Este trecho final é sobre a rocha nua, então é preciso se atentar com as sinalizações existentes, caso a neblina permita a visualização das setinhas brancas.

Finalmente às 15:51 alcanço o abrigo no topo do Pico do Itambé. O GPS registrou 2.062 metros de elevação, valor próximo do aferido mais recentemente, tendo em vista que a carta topográfica de Rio Vermelho, datada de 1977, indica “somente” 2.002 metros no pico. É cume no Teto do Sertão, ponto culminante de toda a cadeia de serras do Espinhaço.

Do pico o tempo estava bem melhor do que o esperado e a tarde foi de muita contemplação. Vista para os povoados de Capivari e Milho Verde, além das cidades de Santo Antônio do Itambé, Serra Azul de Minas e Diamantina. Olhando para o norte era possível avistar a região da Bica d’Água, encaixada entre a Serra da Bicha e a continuação da Serra do Itambé, onde pernoitaríamos na noite seguinte. Também para o norte, no horizonte o destaque era a elevação da Chapada dos Couto e do Pico Dois Irmãos, trecho correspondente ao terceiro dia de travessia. O Itambé é mesmo impressionante!

Visual para o norte

A tarde, no entanto, não foi só de contemplação. No pico tem um abrigo de montanha, onde entrei e já coloquei algumas coisas pra secar, aproveitando o vento constante da região. Como havia chovido, aproveitei uma das poças que se formaram perto da casa para tomar uma espécie de banho rs, já que não há água encanada e muito menos chuveiro na casinha. Tirei um pouco da água que estava empoçada dentro da casa, perto das portas, deixando o lugar bem maneiro para dormir. Mais tarde um grupo, que subiu por Capivari, chegou ao cume também. E lá pelas 19:00, com a noite já dando as boas vindas, o Paulo chegou ao pico, trazendo consigo o chapéu que eu havia perdido durante o trecho final da subida.

A noite foi de descanso, preparação de janta e recarregar as baterias dos dispositivos eletrônicos, já que a casa possui energia elétrica. Como optei por não levar barraca, bivaquei em um dos quartos e a noite foi bem agradável, já que a casa é bem abrigada. Levando a barraca, também terá que dormir dentro de casa, já que é proibido acampar do lado de fora. Por isso o limite de pessoas para pernoite é de apenas 15.

Neste dia caminhei 20.4k. Entre Santo Antônio do Itambé e o Pico há um desnível de 1.349 metros.

2º dia: Pico do Itambé x Bica d’Água (Casa do Seu Santos)

O final da noite foi complicada. O grupo que veio de Capivari acordou por volta das 4 e desatou a falar, como se não houvesse ninguém no local. Pedimos silêncio e eles alegaram que estavam de saída. Depois de um bocado de tempo o silêncio reinou e conseguimos dormir mais um pouco. Pouco antes das 6 resolvo levantar para averiguar a possibilidade de ver o sol nascendo.

Da janela do quarto era tudo nuvem e neblina, mas quando coloquei os pés lá fora vi que ia rolar demais o nascer do sol e corri para chamar o Paulo, que queria fazer umas imagens de drone. Pra nossa surpresa, o grupo bagunceiro de Capivari estava lá fora esperando o sol nascer também, não devem ter calculado bem o horário.

O nascer do sol foi muito bonito, como sempre é, mas minutos depois do sol ultrapassar o mar de nuvens o tempo fechou no pico e ficamos sem visual. Retornamos ao abrigo para descansar mais um pouco e fazer o desjejum, não tínhamos pressa, já que a caminhada do dia era bem curta, em termos de quilometragem.

Raiar da aurora

Por volta das 8 horas um guarda-parque de Capivari chegou ao Pico, como de rotina. Não tardou muito e ele veio nos indagar sobre uma “sujeira” que estava na beirada da casa das antenas, vizinha ao abrigo. Meio sem jeito ele foi direto ao ponto e falou que alguém cagou na beira da casa e largou tudo lá com papel higiênico e tudo. Inacreditável. Depois que o outro grupo negou participação no delito e jogou a barra pra cima da gente, o líder deles assumiu a bomba e foram lá limpar a cagada, literalmente. Inaceitável essa falta de noção, que já havia começado no falatório das 4 da manhã.

Infelizmente situações desagradáveis têm sido cada vez mais frequentes nas trilhas mais movimentadas. Para que essas coisas não se repitam mais no Pico do Itambé, o Parque deve construir, em breve, um banheiro no local. O que é muito importante, ainda mais quando algumas pessoas carecem de noção e bom senso.

Depois dessa manhã nada agradável, às 9:15 deixamos o pico, pegando a trilha que desce no sentido noroeste. Em pouco mais de 200 metros de caminhada chegamos ao ponto de água, escondido numa grota entre as rochas. Abastecemos nossas garrafas para dar prosseguimento.

O tempo estava fechado, com teto baixo, mas não havia neblina no pico. A medida em que perdíamos altitude, as nuvens ficam mais esparsas e a paisagem ia ficando mais nítida no fundo do vale. A descida do pico pela trilha de Capivari é muito acentuada, com diversos degraus e trechos escorregadios. Por vezes o caminho deixa as trilhas convencionais para descer por rochas e fendas. A descida é tão íngreme que em alguns pontos não é possível ver a continuação da trilha. Em dois pontos é preciso se enfiar em buracos e passar sob grandes rochas!

Em um trecho de declive bastante pronunciado, deixamos as cargueiras e um canto para subir umas rochas à esquerda, onde o Paulo fez umas tomadas de drone. Depois de vencer o trecho mais crítico da descida, a trilha percorre alguns campos no sopé do Pico, em declive moderado. Um pouco antes de chegar na estradinha que passa na base do pico, já com o visual das casinhas da região, paramos num modesto mirante para fazer um lanche.

Ficamos parados por pouco mais de 50 minutos, retomando a caminhada às 12:23. Dez minutos depois terminamos a descida mais acentuada e chegamos a uma encruzilhada, onde uma estradinha cruzava a trilha. Dobramos à direita na estradinha, seguindo as placas da travessia. Passando próximo das casinhas, o Paulo decolou o drone mais uma vez, fazendo com que alguns moradores da Casa do Seu Lindomar saíssem curiosos para ver do que se tratava aquela zoada.

Cachoeira da Bica d'Água e Pico do Itambé

Seguimos pela estradinha morro abaixo, para o fundo do vale do Córrego Bica d’Água. Uma das nascentes do córrego estava formando uma belíssima cachoeira nas encostas do Pico do Itambé, o que rendeu algumas paradas para fotos. Já quase no fundo do vale, a estradinha termina próximo a um rancho isolado. Como fomos seguindo instintivamente pela estrada, acabamos perdendo a entrada de uma trilha mais batida, por onde o caminho segue, aí tivemos que atravessar uma capoeira com muita samambaia e alguns caminhos de vaca até chegar numa tronqueira, onde interceptamos o caminho principal.

Depois de passar pela tronqueira vamos descendo pela trilha, até que interceptamos uma outra estradinha, por onde passamos a seguir. Trata-se de uma estradinha recém-aberta, que aproveitou em partes o traçado da antiga trilha que passava na região.

Às 13:52, depois de percorrer 5.1k, cruzamos um afluente do Bica d’Água, que na carta aparece como Córrego Serra da Bicha (posteriormente o Felipe do Serra Sertão me explicou que o tal Córrego da Serra da Bicha cai pro outro lado da serra). No local fizeram uma pequena barragem para facilitar a passagem de veículos. Reabastecemos num ponto de água corrente e continuamos pela estradinha, agora de olho na saída para a Cachoeira da Cortina.

Antes de embarcar nesta travessia procurei o sempre solícito Francisco Chico Trekking, que me explicou mais ou menos onde encontraria a trilha velha que me levaria em direção à cachoeira. Acontece que, da última vez que ele passou no local, que nem faz assim tanto tempo, a estradinha ainda não existia! Ou seja, não tinha mais sinal de trilha antiga nenhuma! Como a estradinha foi aberta recentemente, o terreno das margens foi todo revirado, apagando qualquer rastro de trilha suja, sem falar que as samambaias dominaram a região. E quem caminha sabe que samambaia é uma coisa bem chata!

Mais ou menos no ponto que o Chico me informou, fui procurar uma trilha que me levasse para a cachoeira, mas só achei trilha de gado e muito mato! rs. Embrenhamos num matagal até que encontramos um afloramento rochoso, onde subi para ter um panorama da região. Do alto percebi que não havia a menor condição de chegar na cachoeira por ali, mas pude observar um trecho de campos adiante, ao norte. Então retornamos até a estradinha e seguimos por ela até encontrar uma espécie de saída, por onde a terra excedente foi empurrada pra cima de um trecho de campos.

Sem querer sofrer muito, dessa vez deixamos as cargueiras na sombra e seguimos sem peso, só com câmeras e outros dispositivos. Uma trilha discreta no capim nos leva até um afloramento rochoso, por onde vamos descendo em direção ao córrego. Devido ao desnível não é possível chegar diretamente ao córrego, de forma que, após descer o máximo, seguimos rio acima margeando o paredão. No caminho é preciso se atentar com algumas plantinhas com espinho, fendas profundas, em que é necessário pular, e trechos escorregadios, onde qualquer descuido pode provocar um grave acidente.

Margeando o paredão chegamos ao leito do córrego, com vários blocos rochosos empilhados. Trocamos de margem e passamos a seguir por trilhas de vaca até encontrar a cachoeira, que já estava bem próxima! A Cachoeira da Cortina fica meio escondida entre os paredões, mas é de uma beleza singular. O sol ilumina bem o local somente em algumas épocas do ano. O poço tem várias partes “rasas”, que “dá pé”.

Chegamos lá às 14:45, depois de percorrer 6.2k, descontados os erros rs. Ficamos uma hora no local, entre fazer imagens de drone e curtir o poço. O retorno foi tranquilo e rapidamente chegamos até o local das mochilas. Continuamos pela estradinha e logo chegamos ao seu fim, no local havia uma caminhonete estacionada, muito provavelmente do pessoal do sítio que passaríamos em seguida.

Cachoeira da Cortina

Passamos por um afluente do Córrego Bica d’Água e, depois de uma breve subida, iniciamos uma descida forte até a baixada. Ainda durante a descida foi possível avistar o sítio e o pessoal tocando o gado pro curral. Depois de atravessar um brejinho, cruzamos uma tronqueira e fomos avisados sobre um gado bravo que estaria no caminho. Pelo menos foi isso que entendi rs.

Quando nos aproximamos da casinha, um rapaz veio em nossa direção e começou a puxar assunto, logo se apresentou e nos convidou pra tomar um cafezinho, que não negamos rs. Ficamos um tempinho lá no quintal da casinha, que estava movimentada no feriado. Depois de um bocado de conversa, pé na estrada, já estávamos nos quilômetros finais do segundo dia de caminhada.

Agora o trajeto é pelo leito de uma antiga estradinha, mas no caminho só se observa uma trilha bem demarcada. Acompanhando o Bica d’Água, seguimos por terreno estável. Antes de chegar ao nosso local de pernoite, ainda passamos por mais um afluente do córrego principal. Às 17:55 chegamos à tal da Bica d’Água, local onde moram Seu Santos e a Dona Maria, um casal bem maneiro que nos recebeu super bem.

Quando chegamos somente Dona Maria estava, Seu Santos estava trabalhando na obra de uma propriedade vizinha. Aproveitamos o fim da tarde para tomar um banho no poços que existem em frente a propriedade, no Córrego da Bica d’Água. Tempo de lavar as roupas também, o que não foi possível no dia anterior.

Durante a noite fomos todos pra cozinha, Dona Maria havia preparado uma janta pro Paulo e eu resolvi aliviar o peso da mochila, cozinhando arroz, lentilha, ervilha e cenoura, que ganharam a companhia de dois ovos caipiras.

A noite passamos numa benfeitoria do quintal do Seu Santos, onde ele construiu mais um fogão a lenha sobre um telhado de palha. Paulo decidiu se enfiar na barraca e eu fiquei só no bivaque mesmo, já que não havia levado barraca. Mesmo no quintal e sem paredes, a noite foi bem calorenta!

Neste dia caminhamos 10.5k, descontado os erros.

3º dia: Bica d’Água (Seu Santos) x Caza do Mozart

O terceiro dia era bem longo, já que teríamos que subir até a Chapada dos Couto e caminhar um bocado por ela, por isso resolvemos acordar junto com os galos, no raiar do dia. Despertamos um pouco antes das 6h e fomos logo adiantando as coisas. O tempo estava bem encardido e logo desabou uma chuva, que não de trégua. Tomamos o café, mas ficamos esperando a chuva dar uma diminuída, o que atrasou nossa saída em mais de uma hora.

Às 7:36, entre uma estiagem e uma garoa, deixamos a morada do Seu Santos. O início do terceiro dia é pela estradinha de acesso à Bica d’Água, prejudicada em alguns pontos. Seguimos no rumo norte, por um terreno ondulado que passa por algumas casinhas bem isoladas. Pelo caminho me chama atenção alguns afloramentos remanescentes, que talvez pudessem ser considerados testemunhos.

Testemunhos

Depois de 3.8k de caminhada passamos ao lado de um sítio, que fica à direita. Neste ponto deixamos de caminhar pela estradinha, para tomar uma trilha que contorna esse rancho, passando por uma capoeira. O dia ainda estava feio, mas a chuva tinha dado uma segurada. A trilha se encaminha para capões de mata, logo chegamos a uma bifurcação e nos mantivemos à direita. Mais a frente chegamos a um local conhecido como Sumidouro, a travessia do Ribeirão Soberbo.

Como aprendi lá na Bahia, neste trecho o rio corre “engrunado”, sob os vários blocos rochosos empilhados. Daí é preciso pular entre os blocos até alcançar a outra margem, por onde continuamos por uma trilha suja. Agora vamos subindo, ainda dentro de um capão de mata. Na primeira bifurcação mantivemos o rumo, na segunda ia optar pelo caminhos mais batido da esquerda, mas voltei atrás e subi pelo caminho mais sujo da direita. Logo percebemos porque o caminho estava sujo: uma árvore caiu e dificultou um pouco a passagem, daí fizeram um pequeno contorno (a trilha batida). Passamos pelo emaranhado de troncos e demos prosseguimento, agora em aclive constante.

Saindo do capão de mata a trilha alterna trechos bem sujos, com o trilho praticamente engolido pelos capins laterais, com outras passagens mais consolidadas. A medida que subimos, o caminho vai se abrindo e vamos nos aproximando do bairro do Covão. Chegamos à escola do Covão às 10:05, depois de percorrer 6.5k. Fizemos uma boa parada no local, com direito à lanche, reabastecimento das garrafinhas e sinal 3G da Vivo.

Neste ponto é interessante reabastecer todos os recipientes, pois tem início um longo trecho sem disponibilidade de água, que termina somente na chegada da Casa dos Guardas, após mais de 11k de caminhada praticamente sem sombra.

Às 10:42 saímos das dependências da escolinha e voltamos à estrada, por onde seguimos para o norte. Andamos cerca de 1k e dobramos à direita numa bifurcação. Essa outra estradinha é um dos acessos à localidade de Santa Cruz. Seguimos em ligeiro aclive, passamos por uma água abundante na lateral da estrada e tomamos à esquerda na bifurcação seguinte. A subida ia ficando um pouco mais forte e seguíamos acompanhando uma cerca.

Vamos avançando pela Chapada dos Couto, nos aproximando do Parque Estadual do Rio Preto – PERP. Em alguns momentos deixamos a estradinha para cortar caminhos por trilhas ou afloramentos rochosos. Depois de uma subida mais pronunciada, que parecia ser o fim, cruzamos uma porteira caída, mas lá no alto descobrimos que ainda tinha mais coisa pra subir rs. O terreno, no entanto, ficava mais suave e quase não sentíamos o aclive. Por uma estradinha velha vamos cortando a Chapada dos Couto, agora com amplos visuais, principalmente para o sul e oeste.

Após uma ligeira baixada, por onde passamos por uns afloramentos rochosos, avistamos no horizonte a porteira do PERP. Caminhamos de encontro a ela e às 13:44, depois de percorrer 16.2k, enfim, chegamos ao Parque do Rio Preto. Não havia ninguém por ali para nos receber, então continuamos pela estradinha, agora em declive, em direção à Casa dos Guardas. Adiante passamos por uma plaquinha que indicava ser ali a nascente do Rio Preto. Aí é uma confusão de nomes, pois a carta topográfica da região indica que ali é uma das nascentes do Córrego Taioba, que não deixa de ser um afluente do Rio Preto.

PERP e Pico Dois Irmãos

Às 14:09 chegamos à Casa dos Guardas, onde fizemos uma parada um pouco mais demorada. Além de comer, precisávamos decidir sobre o ataque ao Pico Dois Irmãos. Eu estava bem disposto, mas o Paulo estava meio ressabiado com o tempo meio nublado e a impossibilidade de fazer o drone voar lá de cima. Conversamos um pouco com os guardas, arrisquei algumas notas no violão e abastecemos nossas garrafinhas com água gelada. Paulo até passou um café pra recobrar o ânimo rs.

Depois de convencer o Paulo a ir, com o irresistível argumento de carregar o drone pra ele rs, saímos da Casa dos Guardas às 15:10, um pouco mais tarde do que havíamos imaginado. Ao invés de continuar no rumo norte, tomamos uma trilha que se encaminha para leste, cruzando campos de altitude em ligeiro aclive. A trilha é bem consolidada em meio à vegetação rasteira. Passamos por dois pequenos cursos d’água e duas tronqueiras, inclusive a segunda estava complicada de abrir.

Este trecho até o campo nos reservou algumas surpresinhas. Primeiro encontrei uma serpente de bobeira na trilha, mas que com a minha aproximação logo se mandou. Depois encontramos algumas outras serpentes pequeninas, tanto na ida como na volta do pico. Mas nada de sustos, somente a surpresinha de ver uma coisinha diferente no caminho.

Avançamos pelos campos até interceptar o aceiro, que vai acompanhando a cerca do Parque. Seguimos até a bifurcação com a trilha que vem ou vai para a Casa do Mozart, onde o guarda-parque nos esperava para as últimas instruções. Deixamos nossas cargueiras por ali e às 15:58 partimos em direção ao pico, levando somente o necessário. A caminhada segue pelo aceiro, com um pequeno atalho pelos campos. Mais a frente, já próximo a uma das encostas do pico, é preciso atravessar a cerca de arame farpado para continuar pela trilha. O caminho está bem sinalizado com setas amarelas. Vamos contornando o pico até chegar ao seu “dorso”, por onde tem início uma curta e rápida ascensão ao topo.

Às 17:03 colocamos nossos pés no topo do Pico Dois Irmãos, o ponto culminante do Parque Estadual do Rio Preto, onde o GPS apontou 1.836m de elevação. As nuvens rebeldes se afastaram e uma belíssima tarde de sol deu as caras. De lá se tem uma visão privilegiada da área do PERP, do Pico do Itambé e da Serra da Bicha, das cidades de Felício dos Santos e Rio Vermelho.

Depois de uma boa contemplação e de alguns voos de drone, às 17:48 iniciamos o retorno. A descida foi ligeira e às 18:29 já estávamos no ponto onde deixamos as cargueiras. Mastigamos algo e já colocamos as cargueiras nas costas para sair andando, para evitar ao máximo caminhar a noite, que já se aproximava.

Visual para o sul

A caminhada segue por uma trilha bem discreta em meio aos campos de altitude da região. A trilha vai contornando uma nascente e mais a frente o pisoteio fica melhor definido. Passamos por um afluente do Córrego Taioba às 18:57 e o cair da noite se aproximava com rapidez. Uma chuva ameaçava cair próximo da gente e apertávamos o passo. Em declive, avançando próximo a drenagens dos afluentes do Taioba, um estranho ruído nos acompanhava. Muito provavelmente de algum bichinho empolgado que vivia por ali na beira d’água.

Adiante interceptamos a trilha consolidada que vem diretamente da Casa dos Guardas e o caminho estreito praticamente se transforma em uma estradinha. Aproveitando o fiapo de luz natural que restava, sigo em ritmo constante num ligeiro declive. Mantivemos à direita numa bifurcação, evitando o caminho que nos levaria direto à antiga Casa dos Guardas, na beira do Córrego Taioba. Pela direita, já com auxílio da lanterna, vamos seguindo entre afloramentos rochosos e capões de mata, cruzando alguns afluentes do Taioba. Enfim, às 19:51, chegamos à Casa do Mozart, o último ponto de apoio dessa travessia entre os parques.

A nossa disposição havia um fogão a gás, camas e colchões, um banheiro com água gelada e alguns equipos e mantimentos de cozinha. Nas paredes um pouco da história de Seu Mozart, que viveu por ali até o começo dos anos 2000 e foi considerado um dos protetores da Chapada dos Couto. A casinha conta também com energia elétrica, gerada por um painel fotovoltaico.

O resto da noite foi de janta e descanso. Um vento frio soprava com força do lado de fora da casa e assobiava pelas frestas das janelas, portas e telhado. A noite foi muitíssimo bem dormida no aconchego de um colchão de verdade.

Neste dia caminhamos 29.5k.

4º dia: Casa do Mozart x PERP

Acordei a contragosto por volta das 6:30. A vontade era de ficar no aconchego até mais tarde, mas ainda tínhamos um bom caminho a percorrer, cachoeiras para nadar e uma carona para arrumar. Mesmo assim nos enrolamos um pouco e acabamos saindo da casa somente às 8:05, sob um céu repleto de nuvens.

Como saímos mais tarde, um dos guardas-parque chegou para nos acompanhar por um pedaço do caminho. Nada demais, somente protocolo do PERP. Deixamos o Mozart por uma trilha que se encaminha para sudoeste em ligeiro declive. Logo passamos pela antiga Casa dos Guardas e cruzamos o pequeno e profundo Córrego Taioba. Iniciamos uma subida moderada pelos campos, margeamos um capão de mata e, rapidamente, chegamos ao topo do morrote, uma área de campos rupestres e afloramentos rochosos, onde paramos para mais uma tomada de drone. Embora fosse uma área bem ampla, não tínhamos muito visual do entorno, devido aos afloramentos rochosos, verdadeiras esculturas.

A trilha começa a descrever um ligeiro declive e logo estamos em uma descida moderada, com muito cascalho e pedras soltas que demandam atenção. A nossa volta vellozias e outras plantas características dos campos rupestres compunham a paisagem. No horizonte o visual do Rio Preto, no fundo do vale, e do Morro do Alecrim, referência para quem desce.

Morro do Alecrim

Às 9:15 chegamos à passagem pelo Rio Preto, segundo a carta do IBGE. Para os locais, ali é o Córrego das Éguas, sendo que o Rio Preto está em uma drenagem do outro lado da serra, à direita. Independente do nome, fizemos a travessia, até ali foram 3k.

Fizemos uma ligeira parada, somente para mastigar alguma coisa. No retorno, fomos seguindo por campos de altitude em ligeiro aclive, ladeando o Morro do Alecrim, a grande referência neste trecho da caminhada. A trilha segue, a princípio, para o oeste, depois vai descrevendo uma curva para direita até retornar ao rumo norte. Nas “costas” do Morro paramos para checar o sinal de telefone, Paulo queria ver se o Tonhão, gerente do parque, adiantava uma carona até a cidade pra gente, tendo em vista que o último ônibus saía de São Gonçalo do Rio Preto um pouco antes das 18h. Mas não tivemos sucesso na empreitada e aceleramos serra abaixo.

Em ligeiro declive seguimos por uma trilha ampla, com cascalho e pedras soltas. No horizonte tínhamos a Serra Mata dos Crioulos, que nos chamava bastante atenção. O guarda-parque nos acomapanhou até a bifurcação que leva para a localidade de Abóbora. Neste ponto continuamos pela direita, seguindo em direção aos atrativos do PERP.

Vamos descendo por uma encosta, com um amplo visual para o fundo do vale. Pouco depois da bifurcação, a trilha que seguia estável em constante declive possui uma quebra de relevo mais abrupta. Passamos a descer diretamente sobre as rochas, em lajeados. Neste trecho em que se aproxima do Córrego das Éguas (segundo carta do IBGE), aquela trilha ampla e bem consolidada dá lugar a uma caminhada sobre lajeados, onde a navegação não é tão simples e exige atenção.

Com o terreno novamente mais estável, chegamos ao Córrego das Éguas às 11:22 e fizemos uma pequena parada para descanso e pra levantar o drone, pois era uma região bem interessante, com vários afloramentos rochosos que se assemelhavam a testemunhos.

Depois da travessia a caminhada segue em nível e vamos nos aproximando de alguns afluentes do Rio Preto. Às 12:16 chego ao primeiro dos dois afluentes que é preciso cruzar em sequência. Embora sejam duas travessias simples, pode ser que as pessoas queiram tirar as botas nesse local, para não correr o risco de molhá-las. Eu não estava ligando para muita coisa então pulei algumas pedras na tentativa de molhar o menos possível.

A essa altura o Paulo já tinha ficado um pouco pra trás, então prossegui em um ritmo mais lento. A trilha deixa os campos rupestres e de altitude e se embrenha nos capões de mata e no cerrado que margeia o Rio Preto. Ignoro todas as saídas da trilha e vou seguindo sempre pela direita. Com a minha presença, um teiú sai em desabalada carreira pelo cerrado, somente foi possível ouvir o barulho das folhas secas e galhos caídos…

Cachoeira do Crioulo

Finalmente, por volta das 12:30, chego ao topo da Cachoeira do Crioulo, já na parte mais frequentada do parque. Cruzo o Rio Preto pela ponte de madeira e observo algumas pessoas na parte de baixo da queda, aproveitando as praias do rio. Esperei o Paulo por alguns minutos, mas nem sinal dele. Como ele já conhecia a área e, acima de tudo, tinha um GPS à disposição, resolvi descer de uma vez e esperá-lo na cachoeira.

A trilha contorna um afloramento rochoso e desce por uma passagem entre as rochas, com alguns degraus altos para ajudar rs. Às 12:52, depois de percorrer 12.8k, chego ao poço da Cachoeira do Crioulo, considerada uma das mais bonitas da região de Diamantina. O grupo que eu tinha visto lá do alto já havia partido para a cachoeira das Sempre-Vivas, então, até o Paulo chegar, tinha uma praia-cachoeira privativa para o meu deleite.

Deixei as tralhas numa das poucas sombras do local e fui aproveitar a água. A cachoeira mesmo é pequena para os padrões do Espinhaço, mas a queda tem sua beleza e forma um poço grande, ótimo para banho. Nas margens uma prainha de areia bem branca compõe o quadro paradisíaco.

Depois de um mergulho voltei para a sombra e fiquei esperando o Paulo aparecer. Quando me preparava para voltar, pra saber o que tinha acontecido, ele aparece nas praias do Rio Preto. Ufa! Falou que tinha batido um pouco de cabeça na travessia dos dois afluentes do Rio Preto, um trecho realmente complicado.

Logo depois apareceu um grupo de 4 pessoas guiadas por um guarda-parque, eles estavam fazendo o circuito das cachoeiras. Aproveitamos a presença deles ali para averiguar a possibilidade de uma carona no final da trilha, já que dali em diante seguiríamos o mesmo caminho. Depois de uma boa conversa o Paulo ajeitou duas vagas com uma dupla de pai e filho, que iriam retornar para Diamantina ao final do dia. Bem o que nós queríamos!

Carona garantida, aproveitamos um pouco mais o poço da cachoeira, até que o grupo se adiantou para conhecer a próxima parada: cachoeira das Sempre-Vivas.

Saindo do Crioulo, o caminho agora é margeando o Rio Preto (IBGE), ora por trilhas consolidadas, ora pelos lajeados de sua margem. Pelo caminho belíssimas formações rochosas e blocos rochosos imensos que se desprenderam atraem minha atenção. São 2.2k rio abaixo até a chegada a cachoeira da Sempre-Viva, um belíssimo degrau do Rio Preto, onde chegamos às 15:59.

A Sempre-Viva possui um poço deslocado, um pouco afastado da queda. A água cai sobre os lajeados como se fosse uma ducha, formando pequenos pocinhos aconchegantes. O sol tinha dado as caras de vez naquela tarde de domingo, então aproveitamos bem o local.

Cachoeira Sempre-Viva

Depois de um refresco, de comer alguma coisa e de algumas imagens de drone, deixamos o local para, enfim, terminar essa grande travessia pelo Espinhaço mineiro. A caminhada segue pelas margens do Rio Preto, seguindo sempre pela direita. São mais 2.1k, entre trilhas laterais, caminhadas sobre as rochas e pula-pedra, até a chegada ao poço da Forquilha, um vau próximo ao encontro do Rio Preto e do Córrego Taioba (IBGE). Ou, segundo o Parque, o encontro do Córrego das Éguas com o Rio Preto/Córrego Taioba.

Aqui não tem jeito, é preciso tirar as botas para não encharcá-las ao atravessar. A água vai até a altura do joelho, afinal, é época de cheia. Às 17:34 deixo a Forquilha no encalço do grupo guiado pelo guarda-parque. A trilha segue em nível, acompanhando o Rio Preto pela margem esquerda, em meio a um capão de mata. Passo pela acesso do Poço d’Areia e pela bifurcação com a trilha que leva às cachoeiras pela parte alta. Adiante passo por uma ponte de madeira e já avisto uma caminhonete do parque. O grupo se dividia entre a caçamba e a cabine. Que maravilha! Evitar justamente o trecho mais chato do PERP, que era uma subida forte por uma estradinha cascalhenta. Ajeitei minhas coisas na caçamba e esperamos alguns minutos até o Paulo chegar. Ele tinha torcido o pé no trecho final pela margem do Rio Preto, então vinha bem maneiro para não sofrer mais.

Depois de quase 15 minutos ele deu as caras, então seguimos todos, de caminhonete, até a sede do parque, que ficava a 1.200 metros dali. E assim terminou essa longa jornada a pé pelo Espinhaço. Chegamos à sede às 18:10 e pedimos uns 10 minutinhos ao pessoal da carona para tomar um banho de gato nos vestiários do PERP. Depois de uma água e sabão revigorante, retornamos ao estacionamento para tomar nossa carona para Diamantina.

Chegamos ao Arraial do Tejuco por volta das 21h. Paulo se arranjou na parte baixa e eu fui pra região central arrumar um de comer. Bati um belo Rochedão no Beco do Mota e me mandei para a rodoviária, mas não tinha mais vaga nos ônibus pra BH. Na manhã seguinte, porém, consegui uma carona paga pra BH e tudo deu certo.

Neste dia caminhamos 19.5k. Ao todo foram 80.1k em 4 dias.

LOGÍSTICA:

Se preferir realizar essa travessia de forma autônoma, sem a locação de uma van, a logística se dará mais ou menos da seguinte forma, utilizando como referência a cidade de Belo Horizonte.
Ônibus da viação Serro para Santo Antônio do Itambé. Pela duração da viagem e pela restrição de acesso ao PESPI depois das 12:00, a melhor opção é pegar o carro das 22:00, na noite anterior ao início da travessia. O ônibus chega em Itambé por volta das 5:00, horário em que está tudo fechado por lá. Se quiser tomar um café da manhã, o jeito é esperar algumas horas ou mesmo combinar com antecedência.

A saída do PERP é um pouco mais complicada, já que não há transporte coletivo entre a sede do Parque e a cidade de São Gonçalo do Rio Preto, que é a mais próxima. As opções são: seguir caminhando (18k), combinar o resgate (o Tonhão pode passar alguns contatos de quem faz o trecho, no momento de agendar a travessia) ou pedir uma carona (ideal em fins de semana e feriados, interessante chegar à sede do Parque por volta das 15:00, assim diminui o risco de perder o ônibus que sai de São Gonçalo por volta das 17:50).

Em São Gonçalo do Rio Preto há um ônibus diário pra BH e vários outros para Diamantina, cidade referência na região. Em Diamantina a viação Pássaro Verde possui vários horários para BH, mas é preciso se atentar com a lotação dos carros, ainda mais em feriados. Desta forma, se possível, é aconselhável comprar com antecedência. Em Diamantina também há muita oferta de carona paga, que são fáceis de conseguir se você já tiver algum contato na cidade.

OBSERVAÇÕES:

Antes de qualquer coisa, a Travessia dos Parques precisa ser agendada, com antecedência mínima de 24h, com as duas gerências. O agendamento pode ser feito por e-mail, através dos endereços:
O PESPI não cobra nenhuma taxa do visitante, já o PERP cobra R$40/pessoa pela pernoite no abrigo do Mozart.

Travessia de dificuldade moderada para experientes, para ser difícil para iniciantes no montanhismo. As longas distâncias a serem percorridas exigem alguma experiência no transporte de cargueiras, além de alguns equipamentos adequados. Os trechos mais complicados são o ataque à cachoeira da Cortina e a descida do Pico do Itambé.

Essa travessia integra duas unidades de conservação estaduais: NÃO FAÇA FOGUEIRAS, LEVE SEU LIXO DE VOLTA, FECHE AS PORTEIRAS/TRONQUEIRAS QUE ABRIR; SEJA EDUCADO COM OS MORADORES E RESPEITE OS COMPANHEIROS DE MONTANHA.

Devido aos pontos de apoio, a barraca pode ser dispensada nesta travessia. No Pico do Itambé é possível bivacar com tranquilidade dentro da casa; no Mozart há a possibilidade de se dormir em camas, mas o bivaque também é possível. Já o Seu Santos trabalha com a dormida na cama e cobra um valor por isso, mas também é possível bicavar no quarto, se não houver cama para todos.

Há a possibilidade de diminuir um pouco o peso da comida e agendar janta e café da manhã na casa do Seu Santos. O agendamento deve ser feito com alguma antecedência, por telefone, informado quando do agendamento junto aos parques. Valores a combinar.

A entrada no PESPI é permitida até as 12:00, independente do agendamento ou da trilha a ser realizada. Eles são rigorosos quanto a isso, chegue cedo!

Há sinal de telefone (VIVO) em várias partes do caminho: na subida para o Itambé, no Pico, na região do Covão, na Casa dos Guardas, no Pico Dois Irmãos, próximo ao Morro do Alecrim, entre outros lugares.

Há boa disponibilidade de água ao longo da travessia, o montanhista, porém, deve ficar atento aos trechos sem oferta de água: final da subida do Itambé, há uma placa avisando, não há oferta de água no abrigo (ponto mais próximo a cerca de 300 metros de lá, sentido Capivari); e um trecho de quase 12k pela Chapada dos Couto, entre a escolinha do Covão e a Casa dos Guardas, já no PERP.

Existem algumas rotas de escape durante a rota, em especial a saída para Capivari no 2º dia, saída sentido Curralinho no 3º dia (pela estradinha que chega ao Seu Santos ou no Covão), saída para as Abóboras ou para Felício dos Santos (via Corredeiras) no último dia. Note que, caso sejam utilizadas essas rotas de escape, são trechos longos por estradinhas vicinais com pouquíssimo movimento de veículos, que demandam várias horas de caminhada.

Existem também variantes desta travessia, que pode se iniciar nas redondezas do povoado de Capivari (Serro), seguir desde a cidade de Itambé pela trilha do Rio Vermelho (que não passa pelo Pico do Itambé), além de várias alternativas entre a Casa do Mozart e a sede do PERP, incluindo também uma saída direto para Felício dos Santos.

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