08/08/2018

Circuito Vale do Pati (Capão x Capão)

O trekking pelo Vale do Pati é um dos roteiros mais clássicos e cobiçados do Brasil, uma região de incrível beleza cênica e algumas cachoeiras para amenizar o calor do sertão baiano. Uma das peculiaridades deste trekking são as diversas formas de acessar o vale. São 7 as trilhas consolidadas ligando o Vale aos povoados e cidades do entorno, sem contar aqueles caminhos mais alternativos.

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Faltava conhecer aquele que é considerado um dos acessos mais belos: a partir do Vale do Capão, cruzando o Gerais do Vieira e o Gerais do Rio Preto. Após chegar ao Vale, a missão seria contornar o Morro Branco e o Morro da Lapinha, elevações singulares no interior do Vale, e retornar ao Capão pela trilha que corta a Mata do Calixto e o Gerais da Lapinha. Aliás, essa é outra peculiaridade deste trekking, voltar para o ponto de partida por uma trilha distinta da ida. Tudo em três dias, aproveitando o Feriado do Trabalhador.

1º dia: Capão x Igrejinha (Casa de João Calixto)

Cheguei ao Capão na sexta a noite e fiquei no local em que estou habituado: camping do Gorgulho, 700 metros antes de chegar ao centro da vila. O sábado amanheceu bem nebuloso, com uma garoa dando as caras de vez em quando. Desmontei a barraca e comecei o deslocamento para o bairro do Bomba, mas antes uma paradinha no meio do caminho para tomar um café reforçado.

O bairro do Bomba fica a 6km do centro do Capão e é o local onde a trilha para o Pati se inicia. A estrada está em condições medianas, como choveu um bocado na noite anterior, formaram-se diversas poças de água e alguns trechos estavam com um bocado de lama, mas nada que impedisse o acesso por um veículo de passeio.

Por indicação do Adriano, que é guia em Andaraí, fui direto a uma lanchonete no final da estradinha, para encontrar um local para deixar o carro estacionado pelos próximos dias. Prontamente a moça que trabalhava no local falou que seu tio tinha um estacionamento, no qual cobrava uma taxa de R$10/dia. Já com o carro estacionado, fiz os últimos ajustes na mochila e dei início à caminhada. Como utilizaria as casas de apoio que existem no interior do Vale, fiz este trekking somente com uma mochila de ataque, de 20 litros, levando somente roupa e algum lanche para a trilha.

Às 10:03 deixava o Bomba e estava cruzando o Córrego da Galinha pela primeira vez. Com a chuva da noite anterior, o córrego estava com um bom nível e a água estava meio barrenta, porém não tive dificuldades na travessia. Depois de 6 minutos reencontrei o Córrego da Galinha, cruzando-o novamente sem dificuldades. Após 775 metros, mais uma vez está lá o Córrego da Galinha. Fiz a terceira travessia, também sem dificuldades, mas ao invés de seguir pela trilha principal, tomei um caminho secundário à direita, margeando o córrego.


A trilha segue próximo ao córrego e rapidamente chego ao Poço da Angélica, local de fácil acesso e muito visitado na região do Capão. Dou uma conferida no poço, com água muito barrenta, e continuo pela trilha. Ela segue a esquerda do poço, acompanhando o leito do córrego. Adiante cruzo a margem e sigo rio acima, até desembocar no rio. Durante o caminho percebo algumas trilhas que sobem a vertente a minha esquerda, como a ideia era tomar um atalho para o Gerais do Vieira, vejo essas saídas com bons olhos.

A partir de certo ponto começo a caminhar pelo leito do Córrego da Galinha. Vou subindo por pequenas quedas até encontrar a cachoeira Purificação. Foram 2.6km percorridos em 50 minutos. O local é bem interessante, com um poço relativamente pequeno, mas que parece bom para banho. Muitas pessoas dizem que essa é uma das água mais geladas da Chapada Diamantina, e realmente parecia rs. Com a água ainda barrenta e o sol tímido, somente descansei alguns minutos antes de descer o rio até uma possível trilha de acesso ao Gerais.

Voltei pouco mais de 400 metros pela trilha que tinha feito até ali, até um ponto em que a trilha atravessa o rio e continua pela direita do córrego (sentido rio abaixo). Logo na saída do córrego há uma bifurcação, a trilha que eu vim segue pela esquerda, mais próxima do leito, enquanto uma outra subia a vertente. Sigo por este novo caminho, imaginando que era o atalho que eu procurava. O início deste trecho é bem demarcado, parece até que foi recém desbastado. A trilha segue em constante aclive, primeiro entre o capão de mata e, depois, por entre uma mata de samambaia. Aí que as coisas começam a complicar. Mesmo com o rastro evidente, as samambaias vão fechando a trilha e tornando o deslocamento mais lento e difícil. Para piorar, o terreno vai ficando cada vez mais inclinado, num aclive que parece não ter fim. Às vezes passava por minha cabeça retornar, mas decidi avançar mais um pouco. O que tornou minha vida um pouco menos complicada foi o fato de eu transportar apenas uma mochila de ataque, ao invés de uma cargueira. Um facão pode até ajudar neste trecho, mas o trabalho de limpar a trilha faria a subida ser bastante demorada.

Depois de vencer alguns degraus, a subida vai ficando mais suave e as samambaias vão ficando para trás. Para meu alívio começo a caminhar por campos rupestres, com amplo visual para o vale do Bomba, as minhas costas. Seguia por uma trilha aparentemente pouco utilizada, mas o rastro estava bem nítido no terreno. Com o terreno mais suave chego a uma bifurcação, 1.1km e 33 minutos depois de ter deixado o Córrego da Galinha. À esquerda escutava o barulho de água, então decidi ir lá para abastecer minha garrafa e jogar um pouco de água na cabeça.

Esta bifurcação já é o encontro do atalho que percorri com a trilha tradicional de acesso ao Vale do Pati. A partir de agora sigo, ainda em aclive, por uma trilha ampla e bem demarcada, que mais parece uma estrada rs. A medida que avanço o terreno vai estabilizando e no horizonte o topo de alguns morros do Pati aparecem. Era o Gerais do Vieira.

Chego então a uma das bifurcações mais importantes do caminho: à esquerda uma trilha bem demarcada, porém mais estreita, segue em direção à Mata do Calixto, numa caminhada relativamente longa e sem pontos de apoio; à direita uma trilha mais ampla segue o caminho tradicional, em direção ao Gerais do Rio Preto. Sigo pela direita e, em relevo suave, vou me aproximando da Serra do Esbarrancado, passando pela cabeceira do Rio Ancorado e pelos afluentes do Rio da Lapinha.

Após cruzar um dos afluentes do Rio da Lapinha, uma bifurcação bem visível aparece. À esquerda a trilha segue em direção ao Rancho e continua sentido Igrejinha, trajeto conhecido como Trilha das Mulas. Para quem esta a pé o melhor caminho é seguir à direita, sentido Gerais do Rio Preto. Adiante cruzo o Córrego Açucena e a trilha, que até então seguia o rumo sul, dá uma guinada para oeste e passa a subir a Serra do Esbarrancado. Essa subida, toda calçada por pedras, é conhecida como Quebra Bunda, nome bem sugestivo, caso você tenha o azar de escorregar numa eventual descida rs.


Depois de 10.3km de caminhada, às 14:05, chego a uma fonte de água no fim da subida do Quebra Bunda, dando início ao trecho pelo Gerais do Rio Preto. Logo chegamos ao ponto mais elevado do trekking, com o GPS marcando 1.416m de elevação. Como não poderia deixar de ser diferente, a caminhada segue em ligeiro declive pelo gerais, uma vegetação semelhante aos campos de altitude, porém com muitos arbustos. Com a chuva forte da noite anterior, o trecho estava bastante encharcado, uma característica local, já que o solo raso fica sobre uma caminhada impermeável (rocha). Como minha bota é impermeável/resistente à água, no entanto, não me preocumei com o lameiro e a terra mole.

Após 7.4km de caminhada pelo Gerais do Rio Preto, com o relógio marcando 16:02, chego ao clássico mirante da Rampa, com vista singular para o Pati de cima (Igrejinha e Cruzeiro) e também para o Morro Branco e Morro da Lapinha, que compõem o belíssimo fundo da paisagem. As luzes douradas tornaram a vista ainda mais atraente e não pensei duas vezes para tirar um bom descanso por ali.

Algumas pessoas chegaram e contemplaram, enquanto outras encaravam a parte final da descida pela Rampa, com um desnível de 200 metros em 580 de extensão. Depois de meia hora de observação, de início a descida. Aos marinheiros de primeira viagem, pessoas que ainda estão iniciando nas caminhadas de montanha, uma descida tipo a da Rampa pode assustar, devido aos degraus altos e diversos pontos com exposição relativa, onde uma escorregão pode ser muito danoso. Como já conhecia a descida e estava leve, fui voando. Em 13 minutos cheguei a uma encruzilhada, onde tomei a trilha da esquerda, que segue para a casa de João Calixto, também conhecido por João Branco, no local ainda mais conhecido por Igrejinha. Cabe mencionar que, nesta encruzilhada, o caminho que segue adiante sobe em direção ao cruzeiro e depois desce para o Pati do meio; enquanto a trilha da direita é conhecida por Arrodeio, um relevo mais suave por onde é feita a passagem dos animais e que também dá acesso ao Cachoeirão por cima.

Sem muitas dificuldades no trecho final, chego à Igrejinha, local que ainda não conhecia e onde faria meu primeiro pernoite, encerrando a caminhada às 16:58.

Mesmo sendo primeiro dia de feriado e sem agendar nada, havia uma cama sobrando por lá, onde me instalei. Um pouco antes das 19:00 serviram a janta, momento mais esperado dos trekkings pelo Pati rs.

Neste dia caminhei 19.2km.

2º dia: Igrejinha x Prefeitura

Depois de acordar cedo, por volta das 06:00, a manhã foi de enrolação na Prefeitura. Como o trajeto era relativamente curto, esperava menos que 10km ao todo, fiquei por lá curtindo a manhã nublada e a correria das várias pessoas que estavam por lá. Às 10:00, em ponto, comecei a caminhada, saindo da Prefeitura no rumo nordeste, partindo em direção ao cemitério. Já na saída passo por uma pinguela, tomando a trilha mais à esquerda em meio ao capão de mata. Logo passo pelo cemitério, continuando por uma trilha bem demarcada rodeada por samambaias. Pouco mais de 130 metros após o cemitério chego a uma bifurcação, para seguir ao Rio Pati é necessário tomar à esquerda, numa trilha “voltando”. Na hora julguei que o caminho certo era seguindo direto, percebi o equívoco quando retornei à trilha principal do vale, no início da descida para a casa de Wilson. Então retornei à bifurcação e tomei o caminho bem demarcado entre samambaias e capões de mata.

Adiante encontro outra bifurcação, mas dessa vez não tive dúvida: descer à esquerda para chegar ao rio. O Rio Pati, ainda próximo das suas cabeceiras, estava em bom nível, com águas não tão escuras como a do restante da Chapada. Vou descendo, acompanhando o rio, por uma trilha na margem direita. Em alguns pontos a trilha se desenvolve no leito do rio, mas nada que dificulte demais a caminhada. Pelo caminho vários pocinhos e algumas quedas chamam a atenção. Vou caminhando tranquilamente e com cuidado, já que, em virtude da chuvinha que virou a noite, o terreno estava escorregadio.

Às 10:39, depois de percorrer 1.3km, chego ao poço da principal cachoeira dos Funis. A queda do Rio Pati tem um tamanho interessante e cai em um poço bom para banho. Sol somente no período da manhã, que normalmente é mais tranquilo. Fiquei um bom tempo juntando coragem para entrar na água, que estava um pouco fria, enquanto esperava o sol dar o ar da graça. Mais tarde nadei um pouco e deixei a cachoeira às 12:12, quando várias pessoas estavam por chegar.


Como estava somente com a mochila de ataque, a tarefa de descer o rio foi relativamente tranquila. Se estivesse com cargueira certamente teria mais dificuldades, alguns trechos não tinham trilha definida, sendo necessário pular algumas pedras pelo leito. Depois de quase 700 metros rio abaixo, chego à trilha que se afasta do leito do rio, partindo em direção ao Pati do meio.

Logo na saída do rio começa uma subida acentuada, que por conta da garoa que caiu pela manhã estava bem escorregadia. Depois de alguns minutos intercepto a trilha principal, que de tão larga poderia ser uma estrada rs. Daqui em diante sigo, predominantemente, em declive, até as proximidades da Casa de Agnaldo.

Depois de passar a Casa de Seu Wilson, que é a primeira para quem vem da Igrejinha, sigo descendo pela trilha principal em meio a mata. Próximo a Escolinha, uma construção abandonada tomada pela vegetação, percebo uma bifurcação e resolvo seguir pela esquerda, imaginando que seria um atalho para interceptar a subida do Castelo adiante. O caminho agora se torna um pouco mais discreto, mas rapidamente chego ao Rio Pati. Sigo subindo o rio por uma trilha bem discreta à esquerda, observando se haveria alguma saída do outro lado do rio. Não encontro essa saída e como a trilha ficava cada vez menos pisoteada, prefiro atravessar num ponto possível e varar um pouco de mato na outra margem, para interceptar a trilha principal de acesso ao Castelo.

O início deste trecho é em ligeiro aclive, mas o terreno molhado pelas chuvas dava sinal de que não seria tão tranquilo assim. Este trecho do rio Pati até o topo do Morro da Lapinha (turisticamente conhecido por Morro do Castelo) é bem sombreado, grande parte da subida é sob uma vegetação densa, característica de mata atlântica. Com as chuvas frequentes nos dias anteriores, a terra virou uma espécie de argila, dificultando todo e qualquer passo. A medida que ia avançando a subida ia ficando cada vez mais acentuada e cada passo tinha que ser planejado, pra não descer escorregando a serra rs.

Mais ou menos na metade da subida a terra/argila vai ficando escassa, dando espaço às rochas amontoadas que cobrem o terreno na parte superior do Morro da Lapinha. Daqui em diante algumas escalaminhadas com pequena exposição à altura até chegar num mirante escondido, que revela uma bela vista do Vale do Pati, do Gerais do Vieira e do Rio Preto. Agora a caminhada se desenvolve em um gerais bem viçoso, mas com menos sombras, numa espécie de selado entre o Morro Branco e o da Lapinha.

Às 13:59 chego a um amontoado de rochas, à direita tenho um vão no meio da serra, é a chamada Gruta do Castelo. Como o sol iluminava a entrada da gruta, continuei a caminhada por dentro dela. Algumas dezenas de metros depois era preciso fazer uma curva dentro da gruta e a escuridão dominava. Saquei a lanterna, que custou a funcionar, e continuei avançando até encontrar a saída.

Para sair da gruta é preciso subir por algumas pedras. Do lado de fora o caminho é discreto, existem dois mirantes, um à direita e outro à esquerda. Logo quando estava saindo encontrei um grupo, o rapaz me disse para seguir pela esquerda, então por este caminho eu fui. (Somente mais tarde, já em Andaraí, fiquei sabendo da existência do mirante à direita rs). Saindo da gruta o caminho é bem acidentado, por diversas vezes é preciso trepar em pedras, subir ou descer degraus. Alguns minutos mais tarde, às 14:14, chego a uma grande rocha plana que forma o mirante do Castelo, depois de percorrer 5.8km.

Dos seus 1.368 metros de elevação, que não é o topo do Morro da Lapinha, se tem uma bela visão do vale do Rio Lapinha e seu gerais, além da Serra do Roncador no horizonte. O bom de subir o mirante na parte da tarde é que o local fica vazio, mesmo em épocas em que o Pati está movimentado. Por lá tirei um bom tempo de descanso, com direito a uma cochilada numa das poucas sombras do local.


Às 15:26 iniciei a descida do Castelo. Como retornaria para o Bomba pela Mata do Calixto, a ideia era adiantar a caminhada e seguir até a Prefeitura. Desci no modo speed e em 50 minutos já estava de novo no Rio Pati. Depois de atravessar o rio passei em frente a casa de Agnaldo e segui pela trilha tradicional vale abaixo. Ainda tinha uma boa caminhada pela frente.

Às 16:28 passei pela casa de Dona Leia e cinco minutos mais tarde pela entra das casas de Dona Raquel e seus filhos, André e João. De Agnaldo até aqui o caminho é em relevo suave, mas após Dona Raquel são várias subidas e descidas acentuadas em sequência. Pouco mais de 1km após a casa de Dona Raquel passo por um ponto de água ao lado da trilha.

O cansaço bateu. Após uma das várias subidas jurei ter visto o telhado da Casa de Jailson, mas a casa nunca chegava. Muito provavelmente algum reflexo nas águas escuras do Rio Pati criaram uma miragem aos meus olhos.

Às 17:19 chego a casa de Jailson, mais conhecida como Prefeitura, por conta da construção de uma edificação por Andaraí em tempos passados. O local estava relativamente vazio, com alguns quartos livres. O início da noite foi de céu aberto e lua brilhando intensamente, ótima pedida para deitar numa das redes da varanda.

Neste dia caminhei 11.4km.

3º dia: Prefeitura x Capão

No terceiro dia de travessia levantei mais cedo pois tinha um longo trajeto de volta ao Capão pela frente. Depois de tomar o café brilhantemente preparado pela família de Jailson, deixei a Prefeitura às 8:12. Ao invés de tomar o caminho mais batido rumo ao Pati de baixo, sigo em direção ao rio, que atravesso sem molhar os pés.

Na outra margem sigo em um constante aclive, 400 metros após sair da casa de Jailson chego à bifurcação que leva à Mata do Calixto. Neste ponto, a trilha mais consolidada segue à esquerda, margeando o rio Pati rumo a casa de Agnaldo. Sigo pela direita, por um trilho menos frequentado, que leva à Mata do Calixto e Gerais da Lapinha.

Continuo subindo por uma trilha rodeada por samambaias. No topo do morrote uma surpresa: uma casinha bem cuidada, com milho e banana plantados. Era a casa de um antigo morador cujo nome não me recordo, mas que está sendo cuidada por Jailson. Após passar pela casinha a trilha faz um mergulho e se embrenha na Mata do Calixto, encravada aos pés do Morro Branco e Morro da Lapinha. Trata-se de uma viçosa mata atlântica, com muitos galhos e árvores caídos pelo caminho que tornam a passagem por aqui mais complicada.

O trecho pela mata é muitíssimo bem sombreado, o que deve ser ótimo em dias ensolarados. Por outro lado, caso seja um período chuvoso, prepare-se para o terreno escorregadio. A trilha segue num contínuo sobe e desce, mas com subidas mais longas. Há vários pontos de água no trecho, água essa que é bem cristalina, diferente da maior parte das fontes chapadeiras.

Por alguns momentos é possível ver a parte superior do Morro da Lapinha, mas não a parte onde fica o mirante. Às 09:28 passo pelas ruínas de uma antiga moradia, embrenhada na Mata do Calixto. Impressiona saber que alguém morou por ali, num local ainda mais isolado e sombrio que o outro lado do Morro Branco. Depois de passar pelas ruínas o som do rio Lapinha vai se destacando e logo começa uma forte descida até o fundo do vale. Às 09:54, depois de percorrer 4.8km, chego à Cachoeira do Calixto, uma queda interessante do Rio Lapinha. Devido às chuvas dos dias anteriores, o rio estava cheio e a cachoeira apresentava um bom volume de água. Diferente da cachoeira do Funil, a do Calixto forma um poço amplo e em área mais aberta, o que propicia uma melhor iluminação pelo sol.

Bom, mas de nada adianta a localização privilegiada se o sol não aparece. Fiquei por lá pouco mais de uma hora e o sol apareceu somente por alguns segundos. O dia não dava sinais de que ia abrir.

A continuação da trilha fica, mais ou menos, na mesma altura de quando se chega ao leito do Rio Lapinha, alguns metros abaixo do poço da cachoeira. A continuação é ainda mais discreta, então é preciso ter bons olhos para identificar o caminho. Depois de identificar a saída, porém, basta seguir pelo trilho em meio à mata, pois daqui até o gerais não há qualquer bifurcação.

Logo na entrada da mata há uma fonte de água bem cristalina, uma opção em relação à água do rio. O caminho segue por um trilho mais estreito, com muitas folhagens no chão, troncos e galhos pelo caminho, deixando claro que a trilha está sendo pouco utilizada. A caminhada pela mata é em ritmo lento, tanto pelos obstáculos no caminho, como pelo constante aclive. São pouco mais de 1.8km em meio a mata até sair nos Gerais da Lapinha, trecho que levei 58 minutos para percorrer, com um ganho de elevação de 220 metros.

No gerais a trilha é um pouco mais ampla e menos acidentada, o que permite um melhor rendimento. Rapidamente chego a um afluente do Rio da Lapinha, que forma uma pequena cachoeira logo abaixo do ponto de travessia. Pelo gerais, uma vegetação às vezes semelhante aos campos de altitude, sigo em ligeiro aclive e rapidamente passo a cota dos 1.200 metros de elevação.

Depois de alguns quilômetros de subida leve, começa uma forte descida em direção a outro afluente do Rio da Lapinha. O que me impressionou nesses afluentes foram as águas mais cristalinas que o normal da Chapada. Depois de deixar a mata que cobre os fundos de vale, saio novamente no gerais, mas dessa vez com a belíssima referência do Manoel Vítor (morro) adiante. À direita, atrás do morro, uma espessa mata, chamada de Baixa Funda, onde fica a nascente do Rio Roncador.

Mais alguns quilômetros pelo gerais e, outra vez, mais um mergulho para cruzar outro afluente do Rio da Lapinha. Depois de cruzá-lo a trilha sai novamente no gerais, que agora é tomado por vegetação arbustiva e pequenas árvores que envolvem mais um afluente do Rio da Lapinha. Desta vez a trilha não passa pela água, há uma subida moderada que vai em direção ao Manoel Vítor, mas que rapidamente volta a tomar o rumo norte.

Momentaneamente livre das cabeceiras dos inúmeros riachos que correm por ali, a trilha segue por campos de altitude em direção a um pequeno abrigo, conhecido como Toca do Gaúcho, onde chego às 14:11, depois de percorrer 13km. O local tem uma gramadinho bem plano e uma área abrigada sob a rocha, mas não possui fonte de água próxima.

Quase 1km após a Toca cruzo um lajeado por onde corre um afluente do Rio Ancorado. Adiante, às 14:43 passo pelo próprio Ancorado, com áreas interessantes para acampar nas proximidades. Sigo a caminhada por relevo estável, observando as formações rochosas que me rodeiam. Dois quilômetros após o rio chego ao entroncamento com a trilha Capão x Pati, por onde havia passado no primeiro dia. Estava acabando!


Por 840 metros repito o caminho que fiz no primeiro dia, até chegar ao início (ou fim) do atalho que leva à cachoeira da Purificação. A partir daí sigo pelo caminho tradicional, descendo do Gerais do Vieira para o fundo do vale do Córrego da Galinha. A descida é pesada, com muitos degraus e mais de 2.5km de extensão. Sem pausas chego ao fundo do vale e às 16:04 reencontro o Córrego da Galinha, já com água mais limpa e volume menor.

Depois de muito andar volto a ver pessoas na trilha e cruzo o córrego mais duas vezes para chegar ao povoado do Bomba, onde finalizo a travessia às 16:13.

Neste dia caminhei 20.5km. Ao todo foram 51.2km ao longo de três dias.

DICAS E INFOS:

De uma forma geral, esta travessia pode ser classificada como moderada para pessoas experientes nesta atividade. Para iniciantes pode ser um roteiro difícil a muito difícil, a depender de como estiver o terreno e o tempo.

O Vale do Pati conta com diversos pontos de apoio, que oferecem pensão completa (janta + cama + café da manhã) a R$120 por pessoa (cotação em maio/2018). Desta forma é possível realizar diversos roteiros no interior do vale carregando o mínimo possível, com a possibilidade de levar somente mochila de ataque, o que aumenta o rendimento da caminhada. De qualquer forma, também é possível fazer este roteiro de forma totalmente autônoma.

Há abundância de água ao longo da rota, ao menos em períodos com chuvas regulares.

Há algumas rotas de escape ao longo da travessia, boa parte delas envolvem a saída para o povoado de Guiné, que é o mais próximo do interior do Pati. Em caso de urgência ou emergência, sugiro contatar os moradores locais e fretar um transfer de mula para a localidade mais próxima.

COMO CHEGAR:

Como se trata de um circuito a logística é facilitada, sendo possível se deslocar em algum veículo até o ponto inicial, sem a necessidade de agendar algum resgate. A caminhada se inicia no povoado do Bomba, que fica a cerca de 6km do Vale do Capão e a 26km de Palmeiras. A partir da cidade de Palmeiras o trajeto é feito em estrada de terra em condições medianas (podendo ser precárias no período de fortes chuvas).

Em transporte coletivo, o deslocamento até o ponto inicial também é relativamente simples. A empresa Rápido Federal tem linhas regulares para a cidade de Palmeiras todos os dias, a partir de Salvador ou do Oeste Baiano. Em Palmeiras são duas opções: fretar um veículo para o Capão ou pegar uma van. Normalmente os “táxis” ficam esperando ao lado do terminal rodoviário, já as vans tem horário (aprox. 05:50 o primeiro, consultar outros). As vans seguem até o Capão, de onde é possível seguir a pé para o Bomba ou através de moto-táxi.

Se estiver em veículo próprio, no Bomba alguns moradores oferecem as próprias garagens como estacionamento. Em maio/2018 estavam cobrando R$10 por dia.

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